Uso seguro, coffee shops e legalização
Países que trocaram a criminalização pelo uso controlado obtiveram bons resultados na luta contra as drogas.
Salas de uso seguro de drogas (Canadá, Austrália, Suíça etc), plantio nacional de maconha (Canadá e futuramente Uruguai), autorização de produção caseira (Espanha) e os famosos coffee-shops (Holanda) são modelos de políticas públicas alternativas que alcançaram bons resultados. Essas ações conseguiram diminuir riscos gerados pelo consumo das drogas em alguns países.
Conseguir livrar o mundo das drogas é praticamente impossível, na avaliação da psicóloga clínica e especialista em dependência química Heliana Fonseca, sócia da Gênesis – Centro de Tratamento da Dependência Química. A razão, segundo ela, é que a droga “faz parte da existência do ser humano, desde que o homem é homem”. “É importante termos vários olhares sobre o tema e unir esforços para conseguir um resultado positivo”, diz.
Nessa linha, muitas sociedades estão reconhecendo que a erradicação é irreal e que sempre haverá algum nível de uso de drogas na população. De acordo com o Consórcio Internacional sobre Políticas de Drogas (IDPC, na sigla em inglês), na esfera de redução de danos há toda uma série de intervenções. Entre elas, a difusão de informações sobre como reduzir os riscos associados ao uso, a oferta de serviços para melhorar a segurança dos usuários (programas de troca de agulhas e seringas ou salas de uso seguro), tratamentos para dependência, atendimento médico, intervenções psicossociais ou grupos de ajuda mútua. Também procura-se identificar e modificar as leis, normas e políticas que dificultem as intervenções ou aumentem os danos.
Diferentemente do que as pessoas podem imaginar, depois de adotar a metodologia de redução de danos, Portugal, França, Espanha, Holanda e Uruguai não registraram aumento do consumo de drogas, diz o psicólogo Bruno Logan.
Conforme relatório australiano que avaliou os quatro anos de operação das “salas seguras” para uso de drogas ilícitas, e que atendem 200 usuários por dia, a medida contribuiu para a queda nos números de mortes, de atendimentos hospitalares e de infectados pelo HIV. Também baixaram acidentes e contaminações com agulhas e seringas deixadas em praias e outros lugares.
Portugal tem uma das experiências mais bem-sucedidas. Desde 2001, quem é pego consumindo ou portando até dez doses de qualquer droga para consumo próprio não é preso nem multado. A lei determina que essa contravenção passe a ter caráter social, e não criminal. O país também promove o acolhimento de dependentes químicos, oferecendo tratamento gratuito, emprego com salário pago pelo governo e incentivos fiscais para as empresas.
O Brasil já teve projeto semelhante. Na gestão de Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo, foi criado o programa De Braços Abertos (DBA), com o objetivo de oferecer medidas de recuperação menos invasivas, com oferta de emprego e moradia. Apesar das críticas frequentes, o programa conseguiu ter mais de 80% de aproveitamento. Dos 416 indivíduos atendidos em 2016, 88% haviam diminuído o uso do crack, 84% conseguiram emitir documento de identidade, 53% retomaram contato com a família e 73% ingressaram na frente de empregos oferecidos pelo programa DBA. Porém, depois que João Doria assumiu a prefeitura, o projeto foi extinto.
Com uma experiência de mais de 34 anos atuando nessa área, Fonseca diz que o mais importante é realizar uma intervenção bem planejada e organizada. “Pior do que não intervir é intervir de forma errada”, afirma. Para Bruno Logan, o grande problema da redução de danos no Brasil é a falta de investimento do poder público.