Cannabis mantém a vida do meu filho, diz mãe de criança baiana com epilepsia
Porque a maconha salva vidas. Não tenho outra resposta, disse, taxativa, a psicóloga Marília Machado, 38 anos, quando questionada sobre as razões pelas quais ela é uma das pessoas que lutam pela regulamentação de medicamentos à base de cannabis no país.
O dia 27 de novembro é lembrado como Dia Nacional da Maconha Medicinal. Para marcar a data, nessa quarta-feira, a Associação para Pesquisa e Desenvolvimento da Cannabis Medicinal no Brasil (Cannab) organizou a Semana da Cannabis Medicinal.
Na tarde dessa quarta-feira (27), ativistas, especialistas de direito e parlamentares baianos discutiram o assunto. Entre os presentes, Marília, mãe de Vicente, 6 anos, compartilhou a história do filho. “Se ele não tivesse o medicamento, não estaria nem vivo. A cannabis mantém a vida do meu filho”, relatou a mãe. Vicente foi diagnosticado com epilepsia refratária de difícil controle e sofre com crises desde que nasceu.
“Já testamos vários medicamentos, os médicos fazem adaptação das doses, mas nenhum funcionou como o canabidiol. É um medicamento que trata e faz prevenção, controle da doença”, explica a mãe. Seu filho já chegou a ter quatro crises graves por mês que o levavam semanalmente ao hospital. Hoje, depois de dois anos usando o remédio, o garoto só tem crises que precisam de internamento em épocas pontuais quando algo anormal afeta seu sistema imunológico – como uma febre, por exemplo.
Para conseguir garantir a medicação, Marília precisou recorrer à Justiça. É que hoje, no país, a única forma legal de consumo de canabidiol é através de importação, que precisa ser autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) diante de laudo e prescrição médica.
Cada frasco de 100 ml da droga custa cerca de R$ 3 mil, quando convertida a moeda e adicionados os custos com o transporte internacional. No caso de Vicente, são necessários quase dois frascos por mês. “Se não tivesse conseguido as remessas na Justiça, não teria como arcar com esses custos”, declara Marília, que já teve medicamentos pagos por município, estado e união, sempre por ordem judicial.
Para todos
“A legislação brasileira só atende quem tem poder aquisitivo. Nossa presença aqui é para buscar essa regulamentação, para que o medicamento possa ser produzido e distribuído no Brasil, pelo SUS”, afirma Leandro Stelitano, fundador e presidente da Cannab – associação em atividade há dois anos.
A Cannab montou uma programação que contará, ainda, com um ato público pela vida, que acontecerá nessa sexta-feira (29), no Farol da Barra. No sábado, um mutirão de atendimento médico gratuito acontece na Fundação de Neurologia. “Hoje estamos aqui para unir forças, essa não é uma causa de direita ou esquerda, é suprapartidária. Um projeto de lei como esse é de extrema importância. Precisamos unir os parlamentares e fazer um grupo de trabalho para discutir o tema”, defende Stelitano.
Atrasados
Quem já discute o tema há anos é o antropólogo e ativista Sérgio Vidal. Estudando o assunto desde 2001, ele destaca a importância do evento. “É muito válido porque marca a discussão do tema, o esforço e a vontade de se discutir o tema na casa. Apesar de ser um pouco frustrante, porque o Brasil está muito atrasado nesse debate, é necessário”, avalia.
Sérgio explica as razões pelas quais entende que a discussão do tema no Brasil está andando devagar. “Já temos muitos estudos e comprovações mostrando a eficiência do medicamento. Em outros países já estão discutindo os termos dessa regulamentação e aqui a gente ainda discute se vai regulamentar”, esclarece o estudioso.
Apesar da análise, ele reconhece a importância do momento. “Foi importante ouvir as mães. Geralmente só ouvimos especialistas, cientistas. Mas é preciso ouvir também a voz dessas mães, dar voz a esses atores principais da causa”, conta ele, que é, também, membro da Associação Brasileira de Cultivo Terapêutico.